*Artigo escrito em conjunto com a advogada Alda Barros
Segundo a Consolidação das Leis do Trabalho, considera-se “empregado” toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário. Entende-se, portanto, que para caracterização da relação empregatícia é imprescindível a presença de cinco requisitos básicos:
- Serviço prestado por pessoa física.
- Pessoalidade: a não possibilidade de substituição, somente a pessoa contratada é a que pode exercer as atividades.
- Não eventualidade: o trabalho precisa ser rotineiro, isto é, realizado de forma frequente, mesmo que não ocorra em todos os dias da semana.
- Onerosidade: o empregado deve receber uma contraprestação pelo serviço prestado.
- Subordinação: ato de cumprir ordens no desenvolver das atividades, por exemplo, determinação de carga horária, responsabilidades, horários etc.
Dessa forma, presente esses requisitos fundamentais, torna-se indiscutível a existência de relação empregatícia, e, consequentemente, todos os direitos e deveres decorrentes dela, como por exemplo: anotação da carteira de trabalho, concessão de férias remuneradas com acréscimo de 1/3, pagamento de 13º salário, horas extras, intervalo para alimentação e descanso, recolhimento de FGTS, entre outros.
Recentemente, tornou-se comum a contratação através da necessidade de abertura de empresa, fenômeno conhecido por “pejotização”; consequentemente, são afastados os direitos trabalhistas, pois o empregado é obrigado a constituir uma empresa individual (pessoa jurídica) para admissão no emprego, e começa a ocupar posição de prestador de serviços.
Pessoa física x pessoa jurídica
Por anos, essa inovação na forma de contratar não foi encarada de forma lícita, uma vez que, grande parte das situações tentava ludibriar uma típica relação de emprego. Todavia, o STF ao apreciar o tema vem consolidando entendimento acerca da possibilidade da “pejotização”: foi o que ocorreu em 2022 com o julgamento da reclamação constitucional número 47843. No julgamento da questão, entendeu a primeira turma do Supremo Tribunal profissional ser lícita a contratação de médicos como pessoa jurídica.
Apesar das recentes decisões favoráveis, não existe possibilidade ilimitada no tocante à “pejotização”, haja vista que a contratação de pessoa física por meio de pessoa jurídica, continua sendo ilícita, se realizada com finalidade de disfarçar uma relação típica de emprego, quando presentes as características de pessoalidade e subordinação.
Deste modo, as regras presentes na Consolidação das Leis do Trabalho continuam válidas; assim, quando presentes as características de pessoalidade, não eventualidade, remuneração e subordinação, não há dúvidas da existência de típica relação empregatícia. Para o afastamento do vínculo, imprescindível é o afastamento da característica da subordinação à relação; posto isso, o trabalho poderá ter todas as características já mencionadas, isso é, pode ser pessoal, não eventual e remunerado, mas não poderá ser subordinado. No entanto, não há definição para o conceito de subordinação, não sendo tão simples descrever essa característica, pois abarca grande margem à subjetividade.
Case internacional
É importante, para o afastamento do conceito de subordinação, que a pessoa jurídica seja especializada na atividade a ser desenvolvida, visto que, se especializado na execução de determinado serviço, consequentemente, não haverá margem para subordinação, uma vez que não haverá necessidade de orientação. Outra forma de afastar a característica da subordinação, é a existência de mais de uma fonte pagadora, dessa forma, o prestador de serviço possuirá diversos contratantes independentes, não sendo subordinado a nenhum deles.
Por analogia, ao analisar o tema, no Caso Dynamex, a Suprema Corte da Califórnia, definiu três requisitos para diferenciação do empregado x contratante independente, o chamado “Teste ABC”: (a) a pessoa não é subordinada (livre de controle e direção) à entidade contratante (b) a pessoa desempenha trabalho que está fora do curso normal das atividades desenvolvidas pela empresa contratante, (c) múltiplas fontes de pagamento para a pessoa que desenvolve os serviços.
A Suprema Corte da Califórnia tentou tornar as características mais objetivas possíveis para o afastamento do vínculo empregatícia, e, se usadas por analogia no Brasil, a subordinação poderá ser afastada em razão da existência de múltiplas fontes pagadores para a pessoa jurídica que desenvolve a atividade e da não existência de subordinação para o prestador de serviços.
Nesse caminho, voem se posicionando a Jurisprudência Pátria, tornando, cada vez mais precisa as possibilidades de “pejotização”. Posto isso, importante ressaltar que se utilizada para ocultar típica relação de emprego, o vínculo jurídico será afastado, sendo devido todos os direitos trabalhistas ao empregado.