O seu aluno cliente é iniciante, intermediário ou avançado? Qual o critério que você utiliza para classificar o nível de aptidão física dos seus alunos? Este é um tema de muita discussão pois, na realidade, observamos que a prescrição do treinamento, em inúmeras situações, ocorre de acordo com critérios que vamos apresentar a seguir.
Parece que existe um consenso, entre os profissionais de Educação Física que atuam como personal trainers, professores de musculação, de aulas coletivas, em academias de estúdios, no que diz respeito à classificação dos alunos clientes: eles são considerados, de forma geral, como sendo iniciantes, intermediários ou avançados. A partir desta classificação, são elaborados os programas de treinamento e respectivas sessões de treinamento ou as conhecidas aulas. É comum aparecer nos quadros de horários “aula recomendada para alunos iniciantes, intermediários e avançados”; “programa para alunos avançados” e por aí vai. Temos então três possíveis níveis de alunos!
Mais recentemente, profissionais e pesquisadores têm procurado encontrar uma forma simples e, principalmente, mais eficiente para classificar os alunos/clientes, em especial aqueles que estão iniciando um programa de treinamento, quer seja na academia ou com o acompanhamento personalizado.
Algumas perguntas que precisam ser respondidas: quais são as características que podem classificar o aluno como sendo iniciante, intermediário ou avançado? Esta classificação realmente consegue fornecer informações significantes para prescrever um programa de treinamento? Entre alunos iniciantes existem diferenças que podem interferir, por exemplo na escolha dos exercícios – intensidade e complexidade? Para encontrar respostas para estas questões, tenho discutido com vários profissionais, de diferentes áreas de atuação, consultado a literatura, na tentativa de fornecer informações que, de alguma forma, vão auxiliar a classificar o aluno e, consequentemente, elaborar um programa de treinamento com menor possibilidades de enganos.
Intensidade x complexidade do exercício
Uma das grandes dificuldades no treinamento personalizado é classificar a condição física atual do cliente quando se busca iniciar o planejamento e a periodização. Marchetti e Lopes (2014) propõem uma classificação baseada no nível de experiência na tarefa específica (aspectos de aprendizagem e controle motor) e condição fisiológica atual do cliente.
Isto significa que, a intensidade do exercício – o quanto de esforço será necessário para realizar exercícios que demandam força, resistência e flexibilidade, por exemplo, está relacionada com o nível atual da condição física; ele será capaz de, fisicamente responder às exigências metabólicas e neuromotores solicitadas? A complexidade do exercício tem relação com o desenvolvimento das capacidades biomotoras, coordenação motora, consciência corporal, percepção de espaço/tempo – aspectos de aprendizagem e controle motor.
Considerando os aspectos fisiológicos e neuromotores (lembrando: eles são interelacionados) anteriormente citados e reiterando a proposta de classificação proposta por Marchetti e Lopes, sugerimos a seguinte classificação para os alunos, tanto os que estão iniciando ou já estão envolvidos num programa de treinamento individualizado (na sala de musculação), personalizado (personal training) ou de aulas coletivas. Para facilitar a compreensão, vamos organizar em grupos de alunos:
Grupo 1 - Sedentários sem experiências anteriores
Os indivíduos sedentários, sem experiência, são aqueles que, ao longo do dia, gastam muitas poucas calorias adicionais, que não têm experiências motores anteriores na prática regular de exercícios físicos (ginástica e musculação, por exemplo), esportes, lutas, artes marciais e dança. É, talvez, a grande maioria das pessoas comuns, que realizam somente o mínimo de atividades cotidianas, com pouco movimento, que, inclusive, devem ter participado muito pouco das aulas de Educação Física escolar.
Grupo 2 - Sedentários, com experiências anteriores
Por algumas razões, se tornaram sedentários, realizam poucas atividades físicas ao longo do dia (gastam poucas calorias adicionais), porém têm experiências anteriores, vivências em alguma modalidade de exercício, esportes, dança, lutas, artes marciais. Tem armazenado na sua memória motora habilidades motoras que foram aprendidas e, que por sua vez, não foram totalmente esquecidas. A sua condição física (aspecto fisiológico) está pouco desenvolvida, no entanto tem facilidade para aprender os “novos exercícios” (aspectos neuromotores). Para esses alunos, a aprendizagem se torna mais fácil.
Grupo 3 - Ativos com diferentes níveis de experiências e condição física
Segundo Marchetti e Lopes, é o sujeito que apresenta boa condição física e treina com frequência. Fica relativamente difícil estabelecer um tempo mínimo de prática, no entanto, alguém que treina regularmente, 3 vezes por semana, seguidamente mais de 6 meses, pode ser incluído neste grupo, pelas adaptações fisiológicas e neuromusculares.
Entretanto, é importante considerar também, para os indivíduos deste grupo, as possíveis diferenças entre o nível de desenvolvimento das adaptações neuromusculares e fisiológicas; o individuo tem a força muscular desenvolvida em níveis satisfatórios para executar determinados exercícios, porém quando a coordenação motora, consciência corporal, estabilidade e mobilidade são necessárias, ele encontra dificuldades para realizar o exercício (Guiselini, 2016).
Poderíamos considerar, também, mais um ou dois grupos de alunos, para efeito didático, como por exemplo: os ativos experts – aqueles que são praticantes há muito tempo em determinada modalidade de exercício, que apresentam alto nível de condição física e respostas neuromusculares, executam com excelente proficiência, pouco necessitando de auxílio. São capazes, na maioria das vezes, de treinarem sozinhos, sem a ajuda dos profissionais. E, por último, os atletas, que se exercitam regularmente com objetivos de alta performance; provavelmente esses não são alunos/clientes das academias, estão nos clubes esportivos.
Lembrando: esta é uma classificação que utiliza critérios com base nos fundamentos fisiológicos, biomecânicos e neuromotores, incluindo aspectos de aprendizagem e controle motor, a partir de observações, entrevistas, anamnese e experiência do profissional. Num primeiro momento, a sua utilização poderá auxiliar a elaboração de um programa de treinamento – escolha das modalidades, intensidade, volume, complexidade… No entanto, recomendamos, para tornar o trabalho mais eficaz, a aplicação de testes para avaliar diferentes indicadores morfofuncionais e possíveis déficits de movimento. A literatura oferece um grande número de testes simples que requerem poucos equipamentos até os mais sofisticados, de alto custo operacional, todos com evidências científicas.
Nossa experiência profissional, ao longo de 53 anos de estudos, pesquisas e aplicação prática, tem demonstrado que o programa de sucesso tem inúmeras variáveis, entre elas compatibilizar os objetivos com as necessidades dos alunos é uma delas. Utilizamos o Sistema de Avaliação Multifuncional, que desenvolvemos para avaliar os possíveis déficits de movimento do aluno, combinados com testes metabólicos e antropométricos, referenciados na literatura, que permitem a prescrição de treinamento de acordo com os objetivos e necessidades dos alunos, todos eles com sólidos fundamentos científicos.
Referências
Guiselini, M, Guiselini, R. Treinamento MultiFuncional: fundamentos teóricos e exercícios práticos. São Paulo. Instituto Mauro Guiselini de Ensino e Pesquisa; 2016. (E-BOOK)
Marchetti, PH, Lopes, C. Planejamento e Prescrição do Treinamento Personalizado: do iniciante ao avançado. São Paulo. Gráfica Mundo; 2014.