Aquacidade está relacionada ao grau de adaptação de uma pessoa ao meio líquido, com poucas chances de se afogar e suas condições de autossustentação, deslocamento no ambiente aquático, consciência corporal e domínio da respiração aquática1; esta última habilidade será abordada neste texto.
A respiração é um processo vital para o corpo humano, desempenhando um papel crucial na manutenção da vida e no funcionamento saudável de diversos sistemas. Este fenômeno complexo envolve a troca de gases, principalmente oxigênio (inspiração) e dióxido de carbono (expiração), entre o corpo e o ambiente.
A respiração fisiológica do ser humano fora d’água, é a nasal, independentemente da idade. A cavidade nasal tem papel fundamental na fisiologia respiratória, ao promover a filtração, aquecimento e umidificação do ar inspirado, fazendo com que o mesmo chegue aos pulmões na temperatura ideal, favorecendo uma oxigenação adequada ao organismo2.
Nas atividades aquáticas, o controle respiratório é um conteúdo essencial para o conforto e depende de uma adaptação, já que ocorre de modo diferente do habitual3. Por exemplo, na natação, diferente do que é feito fora d’água, a inspiração é feita pela boca e a expiração pelo nariz. Ao inspirar pela boca, é possível absorver uma maior quantidade de ar, bem como, ao fazer expiração pelo nariz, de forma ritmada, é possível impedir que a água entre nas vias aéreas, pois ocorre o bloqueio da ação. Estudo recente, feito na Polônia, aponta que a capacidade de respirar ritmicamente durante a natação (inspirando acima da superfície e expirando abaixo da superfície) deve ser considerada como uma competência aquática essencial4.
De fato, faz parte do processo de adaptação ao meio líquido, o aprendizado do controle respiratório na água. Um pesquisador da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) desenvolveu um teste de aquacidade (nível de adaptação ao meio líquido) que contém, dentre os 10 itens, dois que ajudam a mensurar esse (Des)Controle Respiratório5. O objetivo da avaliação destes dois itens é verificar se o aluno já domina a respiração aquática (bloquear e soltar o ar pelo nariz) nas suas diferentes formas e velocidades, sem uso de óculos de natação5 porque é algo essencial no processo de adaptação de quem quer aprender a nadar4.
Os dois itens da aquacidade avaliados, com alunos iniciantes na natação, referentes às trocas respiratórias na água são:
1) bloquear a respiração (apneia) por 10 segundos e repetir por 3 vezes. O aluno não pode usar as mãos para tampar o nariz. A saber, este item verifica se o aluno consegue fazer uma apneia voluntária, mantendo a visão subaquática e a descontração facial durante a expiração embaixo d’água. ( √ )
2) afundar a cabeça na água sem medo, pegar o ar fora d’água (inspirar) e soltar o ar (expirar) pelo nariz e/ou boca de forma lenta, rápida e ritmada (controle respiratório) por 5 vezes. A saber, este item verifica se o aluno consegue fazer uma expiração controlada mantendo a visão subaquática e a descontração facial6. ( √ )
Como o aluno reage ao colocar o rosto na água demonstra para o professor o quanto ele está adaptado ao local. Quem não está adaptado quer tirar logo o rosto da água, passa a mão no rosto, balança a cabeça, não consegue abrir os olhos. Ficar sem respirar momentaneamente com o rosto na água pode ser natural para um aluno e incômodo para outro, ou seja, este último requer uma adaptação a este local7.
É preciso verificar se os alunos ficaram atemorizados ou assustados porque a sua face foi para baixo da água ou a água espirrou nela. Inspirar água acaba sendo um erro frequente que pode resultar em sufocação/tosse e até mesmo aumentar o medo de a pessoa estar na água. Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), os programas de segurança aquática devem ensinar algumas habilidades/competências, dentre elas, as habilidades respiratórias de colocar o rosto na água, submergir e soprar bolhas, prender a respiração e expirar em posição submersa8.
O professor que faz a avaliação na água do controle respiratório precisa verificar se o aluno domina a respiração aquática. Para tal, ele irá analisar se o aluno tem descontração facial, apneia voluntária e visão subaquática, que são habilidades aquáticas interligadas à melhora da aquacidade.
A saber:
(Des)Contração facial
É a capacidade de submergir o rosto na água sem sentir desconforto, como contração dos músculos faciais ou entrada de água nos olhos, nariz ou boca. Enrugar a testa e sobrancelhas ao pôr o rosto na água pode demonstrar medo, tensão, contração muscular que podem indicar falta de adaptação ao meio líquido.
(A)Pneia voluntária ou (a)Pneia estática
É a suspensão momentânea da respiração. Na natação, é a inibição voluntária da respiração enquanto se mantém a face submersa na água. Ela acontece quando o nadador coloca temporariamente o rosto na água e de forma consciente bloqueia a respiração. A apneia é um termo que deriva do grego, onde “a” é um prefixo de negação e “pneia” significa respirar.
Visão subaquática
É uma habilidade que ajuda na adaptação ao meio líquido e é fundamental para quem está aprendendo a nadar. Essa visibilidade na água permite que a pessoa se sinta mais segura e tenha uma melhor percepção espacial e direcionamento. Se a pessoa não estiver adaptada para conseguir abrir os olhos naturalmente embaixo d’água, ela também terá dificuldade para controlar a respiração e terá a sensação do (In)Visível subaquático, ou seja, que não se pode ver embaixo d’água.
A visão subaquática é desenvolvida por meio de exercícios que estimulam a descontração facial e a capacidade de abrir os olhos submersos. Para alguns alunos iniciantes, permanecer com os olhos abertos embaixo d’água é uma tarefa difícil e necessita de adaptação. Abrir os olhos embaixo d’água e não ficar incomodado a ponto de esfregar a mão no rosto demonstra evolução na adaptação. A submersão calma do rosto facilita a adaptação dos olhos à água4 para que ele consiga gradativamente se sentir à vontade quando imergir a face.
Com a melhora da aquacidade, o aluno estará apto a aprender a respiração rítmica para nadar. A respiração rítmica na água é a técnica de sincronizar a respiração com os movimentos de braços e pernas durante a natação. Essa respiração na água difere da respiração normal, pois, a expiração deve ser mais lenta que a inspiração, e a coordenação entre os movimentos é fundamental. A respiração rítmica permite a natação contínua, o que aumenta a autoestima, a autoconfiança e abre caminho para uma ampla gama de esportes e atividades recreativas. Também pode ajudar a proteger e melhorar a saúde (incluindo treinamento de saúde, natação compensatória e corretiva).
Aqueles que são capazes de manter a respiração rítmica enquanto nadam conseguem ter um bom desempenho em emergências e, com habilidades adicionais, podem ajudar outras pessoas na água4.
Respire fundo e desenvolva o controle respiratório na água!
Referências:
- Vasconcellos, Marcelo Barros. Natação Monitorada. Testes desde aquacidade até o nível avançado. Rio de Janeiro: Paco, 2019.
- Veron, HL. Antunes, AG. Milanesi, JM. Corrêa, ECR. Implications of mouth breathing on the pulmonary function and respiratory muscles. Rev. CEFAC. 2016 Jan-Fev; 18(1):242-251.
- Borges RKFM, Maciel RM. A influência da natação no desenvolvimento dos aspectos psicomotores em crianças da educação infantil. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. 2016; 1(9): 292-313.
- Rejman M, Rudnik D, Stallman RK. Goggle-free swimming as autonomous water competence from the perspective of breath control on execution of a given distance. Sci Rep. 2024 Aug 13;14(1):18820.
- Vasconcellos, Marcelo Barros. Natação + segura. Revista empresário Fitness & Health. 2015; 13 (74): 28-29. https://empresariofitness.com.br/atividades-aquaticas/natacao-segura/
- Vasconcellos, Marcelo Barros. Item 2 do Teste de Aquacidade – Controle Respiração. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Ot6iQ3Q9u34.
- Vasconcellos, MB; Macedo, FC. Prevenção do afogamento com uso de conteúdos: Atitudinal, procedimental e conceitual. Latin American Journal of Development, Curitiba. 2021; 3(6): 3741- 54.
- Preventing drowning: an implementation guide. Geneva: World Health Organization. 2017.