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Qualidades do professor de hidroginástica

Colunista: Marcelo Barros de Vasconcellos

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O professor de hidroginástica, responsável pela prestação do serviço aquático, desempenha papel muito importante na percepção de qualidade, satisfação, fidelização1, sobretudo, na adesão, manutenção e abandono da prática regular dessa atividade. O professor precisa criar vínculos com os alunos2 e ter algumas características para mantê-los estimulados a sair de sua residência e entrar na piscina para se exercitar. A Aquatic Exercise Association afirma que inúmeras qualidades são necessárias para que um indivíduo seja capaz de conduzir uma aula de fitness aquático segura, eficaz e divertida3. Mas o que é qualidade? Quais seriam essas qualidades?

O que é qualidade?

Qualidade é uma característica de um indivíduo relacionado ao seu modo de ser, atributo que o diferencia dos demais. A qualidade se refere ao grau de precisão e perfeição, necessários para atingir, neste caso, o padrão esperado pelo aluno. Isso torna a prestação de serviço de hidroginástica essencialmente distinta de produto físico tangível, especialmente no que se refere à garantia de qualidade.

No caso de um produto físico, como celular, pode-se controlar a qualidade ao verificar cada componente (cor, tamanho, funções, memória, peso etc.) e testar antes de comprar. O mesmo não ocorre com serviço. Como por exemplo, o de aulas de hidroginástica, onde o professor serve de intermediário entre a empresa (academia, por exemplo) e o aluno (cliente), contribuindo para torná-lo tangível. Essa interação é denominada de “momento da verdade”, quando o cliente entra em contato com algum aspecto da organização (pessoas, instalações ou equipamentos) e tem uma “impressão” da qualidade do serviço4.

Cada professor é responsável pelo resultado do momento da verdade, na medida em que controla seu próprio comportamento diante de cada interação com o aluno. Se o professor for apático, distante, frio, pouco cooperativo, seus momentos da verdade serão negativos. Se, ao contrário, mostrar-se acolhedor, atencioso, dedicado, didático, tomando iniciativas e propondo ações para atingir os objetivos dos alunos, seus momentos da verdade serão brilhantes e o cliente tenderá a generalizar essas experiências criando uma boa imagem do serviço de hidroginástica.

A percepção de qualidade na hidroginástica

A percepção de qualidade de serviço na hidroginástica pode ser esquematizada nos momentos da verdade do aluno que podem ser assim exemplificados: aluno chega à área da piscina, passa  pelo chuveiro, caminha até a escada, entra na água, sente a temperatura da água, confere o horário de início da aula, absorve a música, interage com outros alunos, escolhe o local para ficar na piscina, sobe a escada, se despede, aguarda o estímulo para retorno na próxima aula dada pelo professor, caminha para o vestiário, se despede do professor. Cabe ao professor acolher o aluno desde o primeiro contato com ele na área da piscina até a despedida para tornar a experiência aquática algo positivo.

Para o aluno, esses diversos momentos formam uma cadeia contínua de eventos e embora ele tenha que lidar com várias situações, trata-se de um único processo.

Vale lembrar que a avaliação da qualidade dos serviços será sempre subjetiva – cada pessoa fará o seu julgamento, segundo seus próprios valores, expectativas e demandas. Entretanto, algumas qualidades do professor ajudam a tornar o serviço de hidroginástica como algo percebido pelos alunos como de boa qualidade.

Exemplo de boa experiência além da piscina

Em entrevista ao professor Vicente Junior, que ministra aulas na Cidade de Juazeiro do Norte, Ceará, ele relatou um caso de experiência de serviço prestado na hidroginástica que ia além da piscina. Disse como uma aluna teve percepção positiva sobre a qualidade do professor de hidroginástica que ela tinha.

Vicente contou que “minha aluna faltou uma semana de aula de hidroginástica e eu liguei para ela, que ficou surpresa pela ligação de um professor preocupado com uma senhora de 70 anos. Ela, a partir deste dia, não faltou mais e ficou tão grata comigo que todo mês ela queria me presentear. Ligava para mim vez ou outra. Pedia conselho, sabe? Pense! Nunca esqueci essa história. A aluna se chamava Dona Rosa”.

Até o momento não se tem conhecimento de pesquisas que aprofundaram sobre os atributos e características que o aluno de hidroginástica deseja que o professor tenha e que devem ser levadas em conta, pelo empregador, no momento de seleção profissional. Assim, o objetivo deste texto é refletir sobre quais qualidades que o professor de hidroginástica precisa ter, para ser percebido como prestador de serviço de qualidade nas suas aulas com seus alunos.

Segundo Vasconcellos (2020), em publicação feita na Revista Saúde Física & Mental, existem pelo menos vinte qualidades (atencioso, acolhedor, cauteloso, corretivo, dedicado, descansado, didático, equipado, focado, inovador, monitorador, motivador, musicalidade, organizado, pontual, posicionado, preventivo, responsivo, saudável e técnico) atribuídas aos professores que podem influenciar na percepção de qualidade do aluno, todas elas têm sua importância, utilização e cinco delas serão apresentadas a seguir em ordem alfabética.

Foto 1. Professor Marcelo Barros ministrando aula de hidroginástica

Qualidades do professor de hidroginástica

Acolhedor – acolha o seu aluno desde o primeiro contato na anamnese, ou seja, saiba receber, escutar, dar acolhida, admitir, aceitar, dar ouvidos, dar crédito às pessoas, atitude de inclusão, que deve estar presente em todas as relações de cuidado, nos encontros reais entre professores e alunos. Após acolher, de acordo com o tempo de prática e nível de treinamento, direcione-o para um dos três grupos: a) alunos iniciantes que estão em adaptação ao exercício físico e devem receber estímulos leves e fracos; b) adaptado ou adiantado que fará manutenção da forma física e devem receber estímulos de intensidade moderado e forte; c) composto dos mais adiantados ou atletas que visam condicionamento e treinamento físico e devem receber estímulos submáximo e máximo.

Didático – planeje a curto e longo prazo, oriente, esclareça sobre como o trabalho será feito para atingir os objetivos dos alunos, tenha bom senso na escolha do método, elabore as aulas usando sequência pedagógica, que pode ser a de sete passos: 1) do mais simples para o mais complexo; 2) do mais importante para o menos importante; 3) do mais seguro para o menos seguro; 4) do mais raso para o mais fundo; 5) do mais fácil para o mais difícil; 6) do mais leve para o mais pesado; 7) do mais baixo para o mais alto9. Planeje cuidadosamente suas sessões semanais para adequar o momento de alterar a intensidade do treino e o número de membros envolvidos em cada ação muscular.

Musicalidade – tenha sentido rítmico, domine a música e as suas contagens, respeite a estrutura musical, articulando o exercício com a cadência musical1. Use a música para dar ritmo5, motivar, manter a sincronização durante rotinas específicas, atingir uma determinada intensidade de esforço, alegrar, gerar associação agradável2 e variar a rotina de aula6. Atente a quatro questões da música: 1) mantenha o ritmo musical de acordo com tipo de população e a profundidade da piscina5; 2) controle a intensidade para cada parte da aula de acordo com sua cadência7 e, para isso, o uso do metrônomo pode ajudar8; 3) selecione previamente o estilo musical de acordo com a turma; 4) ajuste o volume do som para que a acústica não atrapalhe a comunicação entre professor e aluno, pois a altura e estilo de música são motivos de reclamações de alguns alunos na hidroginástica2.

Preventivo – seja precavido, cauteloso, cuidadoso para prevenir acidentes e resguardar a segurança do aluno, prudente ao aumentar a intensidade do exercício, tenha ações voltadas para hidroginástica + segura9. Mensure o grau de aquacidade para hidroginástica de cada aluno iniciante, se os alunos tiverem pouca aquacidade (não estiverem à vontade no meio líquido, com dificuldade para executar os movimentos) adapte gradativamente os alunos iniciantes para que a caminhada, corrida, exercícios de flutuação e deslocamento ocorram sem risco de escorregar ou afundar. Faça um período de adaptação cuidadoso, coloque ele se exercitando perto da borda, segurando na barra ou fique dentro d’água, à distância de um braço do aluno. Inicie a aula com exercícios que possam ser realizados na vertical (com pé no chão) em profundidade mais rasa. Evite prescrever exercícios que requeiram submersão da cabeça ou exposição à água profunda. Ensine o aluno a ter comportamento, atitudes preventivas fora e dentro da piscina a fim de saber identificar possíveis riscos de acidentes ou afogamento; o aluno precisa ser capaz de identificar a profundidade da piscina, área escorregadia no chão, ralos desprotegidos, local adequado para utilização, assim como ter autoconhecimento de quando não entrar na piscina em função de seu estado de saúde atual (mal-estar, alteração da pressão arterial, febre, dor de cabeça ou ingestão de bebida alcoólica).

Técnico – seja um bom executante da técnica, realizando os exercícios em termos técnicos e posturais de forma correta1 sempre sustentados pela biomecânica dos exercícios aquáticos10. Demonstre uma postura e/ou exercício adequado, de vários ângulos diferentes (frente, costas e lado) e por vários canais de comunicação (visual, auditivo e cinestésico) para que o aluno possa compreender e fazer o mesmo. Demonstre o exercício e os gestos, explique, mostre, descreva e, quando for necessário, faça-o sentir o movimento. Contudo, existem alunos que claramente declaram uma não preferência pelo contato físico (cinestésico)5, assim, saiba respeitar estas individualidades.

Foto 2. Professor Marcelo Barros com alunas de hidroginástica

Considerações finais

Todas as vinte qualidades designadas ao professor de hidroginástica são importantes e aplicáveis na rotina de aula. Cabe ao professor de hidroginástica se apropriar de cada uma delas, no momento certo. Essas qualidades podem ser aperfeiçoadas. Assim, professores e estudantes da área de Educação Física, em geral, que sentem dificuldades no contato com aluno, podem melhorar o seu nível de relacionamento com a turma durante a aula. E até mesmo professores que já utilizavam as qualidades de maneira inconsciente, quando se conscientizaram das suas qualidades e da importância da utilização, se sentirão mais seguros no trato com alunos.

Após conhecer um pouco das qualidades e suas características, o professor de hidroginástica precisa fazer uma autoavaliação, para identificar as qualidades que tem e que são evidenciadas na sua relação professor versus aluno e as que ainda não estão plenamente desenvolvidas, para que ele possa aprimorar essas virtudes e, sobretudo, melhorar não apenas como professor, mas também como pessoa. O coordenador também pode verificar quais qualidades norteiam sua equipe de professores e estimulá-los a melhorar. Sugere-se que novos estudos possam investigar as qualidades que os donos buscam ao contratar professores de hidroginástica.

Referências bibliográficas

  1. Campos F, Craveiro D, Alves D, Bernardo F, Cardoso F, Martins F, Mendes R, Gomes R. A Percepção dos praticiantes de hidroginástica em relação à qualidade do instrutor. Revista Iberoamericana de Psicología del jercicio y el Deporte. 2019;14(1):28-33.
  2. Vicente D, Strohschoen AAG, Rempel C, Moreschi C. O perfil dos professores e praticantes de hidroginástica de um município do Vale do Taquari, RS, Brasil. EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires. 2014;19(192):1-6.
  3. Aquatic Exercise Association. Manual do profissional de fitness aquático. 5º edição. Rio de Janeiro: Shape, 2008.
  4. Spiller ES, Pla D, Luz JF, Riccelli PGS. Gestão de Serviços e Marketing Interno. Rio de Janeiro: FGV, 2004.
  5. Oliveira M, Figueiredo T, Domingues V, Figueira A, Nunes P, Figueiredo T, Santos F, Espada M. As preferências ao nível do feedback durante a dinamização de aulas de hidroginástica. Medi@ções: Revista Online da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Setúbal. 2018;6(2):57-65.
  6. Vasconcellos, MB. Hidro Variações. Rio de Janeiro: Shape, 2010.
  7. Barbosa TM, Marinho DA, Reis VM, Silva AJ, Bragada JA, Physiological Assessment of Head-Out Aquatic Exercises in Healthy Subjects: A Qualitative Review. J Sports Sci Med 2009;8(2):179-89.
  8. Alberton CL, Andrade LS, Pinheiro RB, Pinto SS. Anaerobic Threshold in a Water-Based Exercise: Agreement Between Heart Rate Deflection Point and Lactate Threshold Methods. J Strength Cond Res. 2019; April 17.
  9. Vasconcellos, MB. Hidroginástica + Segura: teste de aquacidade para alunos iniciantes. Revista Saúde Física & Mental. 2019;2(7)1-8.
  10. Costa MJ, Cruz L, Simão A, Barbosa TM. Cardiovascular and Perceived Effort in Different Head‐Out Water Exercises: Effect of Limbs’ Action and Resistance Equipment. J Hum Kinet. 2019;69(1):89-97.
  11. Vasconcellos, MB. Quais as qualidades do professor de hidroginástica? Revista Saúde Física & Mental. 2020;1(8):37-48.

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